terça-feira, 8 de novembro de 2011

O PAI DA NOIVA - O dilema de ser politicamente correto.

Teria sido eu o único a chorar ao assistir a comédia “O Pai da Noiva”? Como pode alguém chorar numa comédia, principalmente com Steve Martim? Eu posso. Eu pensava em como me comportaria quando chegasse a minha vez e, por mais que eu tenha implorado para que não chegasse, chegou.

Eu sei que o comum nessas horas é ser politicamente correto com frases do tipo “eu não perdi uma filha, ganhei um genro”. Não é verdade, eu estou ganhando um genro sim e, diga-se de passagem, um excelente genro (dentro do que é possível a um genro), mas também estou perdendo a minha filhinha e ninguém pode dizer o contrário. Não serei mais eu quem vai curar suas feridas ou ficar com ela deitado no chão do quarto olhando as estrelas do teto que refletem no escuro  até que ela se acalme. Quando ela tiver pesadelos minha cama não estará mais a poucos passos, no final do corredor, para que ela termine a noite, segura, entre eu e a mãe dela. Então não me venham dizer que eu não perdi a minha filha, pois não é verdade. Ela continuará sendo, como sempre foi, uma de minhas melhores amigas. Vai me defender com unhas e dentes, como sempre fez, mas não será mais o meu bebê.

Não é possível que os pais que casam suas filhas realmente pensam aquilo que falam. Esta eu ouvi de um colega, cujo filho estava se casando e com planos de mudar-se para o exterior. Quando eu perguntei como ele suportava duas cacetadas ao mesmo tempo, ele respondeu com serenidade: “Nós geramos filhos para a vida”. Confesso que fiquei com uma ponta de inveja pela fibra do meu amigo. Gostaria de pensar assim, mas não penso. Esse deveria ser o meu discurso agora, mas eu me dou o direito de dizer que a vida levou meus dois filhos mais velhos sem a minha autorização e agora vai fazer o mesmo com a minha caçula.

Muitas pessoas dizem que não se prepararam para ficar sem os filhos e que quando o último filho casou, não sabiam mais viver apenas como casal. Eu desenvolvi um relacionamento com a minha esposa em que realmente gostamos de ficar sós. Não colocamos nossos filhos acima do nosso relacionamento conjugal durante esses nossos quase trinta e três anos de casamento. Preocupamo-nos até agora com a segurança e o bem estar deles, mas nunca fizeram com que esquecêssemos de que éramos um casal. Agora, no entanto, parece que isso vai fazer falta no cômputo das horas de convivência. Precisaria de um pouco mais de tempo para curtir os filhos. Não é “mea culpa”, mas talvez seja bom escrever, para no caso de algum deles ler meu texto, se sentir bem.

O politicamente correto nesta hora é olhar para tudo de bom que você ajudou a conquistar. Os três filhos são formados na universidade e bem encaminhados profissionalmente. A caçula, a noiva em questão, tem posições ministeriais muito convictas. É comissária de bordo aprovada na ANAC, mas trabalha como professora de português e literatura na escola mais violenta de Santo André. Parece o filme do Morgan Freeman. Faz isso por duas razões, uma para poder estar na igreja todo fim de semana e outra para fazer capelania escolar e salvar algumas crianças e adolescentes da marginalidade. Essas decisões me enchem de orgulho (e de contas). Na prática meu sentimento é outro. Não sei se outros pais têm o mesmo sentimento, mas eu só consigo me lembrar do que eu não fiz. Sinto que não a protegi o suficiente. Que quando ela me dizia que não era para eu me envolver que ela resolveria, eu deveria ter ignorado sua voz e ouvido a sua alma. Vem-me à mente, as vezes em que, atendendo ao seu pedido, deixei que ela chorasse sozinha trancada no seu quarto. Acho que nessa hora, as coisas que deixei de fazer pesam mais do que as que eu fiz. Não sou depressivo (pelo menos não diagnosticado), apenas me dou o direito de não ser o pai da noiva politicamente correto.

O tempo passa muito rápido e nessas horas  a correria e a euforia para os preparativos só me aborrecem mais. Parece que o Cosmos conspira contra mim. Entrou no ar um comercial de companhia de seguros que mostra um pai com uma criança e o narrador falando das coisas que você não pode evitar que aconteça na caminhada de sua filhinha. Não era hora de lançar este comercial!

Como o blog é meu, eu me dei o direito de não ser politicamente correto nos meus comentários sobre a experiência de ser o pai da noiva. Alguns vão estranhar, outros  certamente vão discordar (dos comentários, não dos sentimentos), mas alguns serão honestos e farão coro comigo. Ser pai da noiva dói!

Dia 11 de fevereiro, no entanto, estarei lá. No altar, junto com a minha rainha, ao lado da minha princesa. Estarei sorrindo, feliz pela felicidade dela. A entregarei ao noivo para que cuide dela dali para frente, com a certeza de que Deus fará parte desse casamento. Como pastor, não tenho dúvidas de que casamento é uma invenção de Deus, como crente, confio que tudo dará certo porque ambos fizeram tudo em oração. Mas que ninguém se engane quando me vir sorrindo...

Sou o pai da noiva